Papo Underground #07: "A Vida dos Headbangers Longe das Metrópoles"

Salve, Salve Homo Metalis!

Nosso Papo Underground de hoje vai ser irado, cheio de novidades para uns e de identificação para outros, pois é dia de falar um pouco de como é ser headbanger no Brasil, melhor dizendo no interior do Brasil.

 

É turma, a vida de banger no nosso Brasil, não é fácil, estamos em uma sociedade ainda cheia de preconceitos, com uma massa populacional predominantemente religiosa e cristã, uma nação ainda cheia de princípios ultrapassados, e por aí vai, a vida de qualquer pessoa que fuja um pouco dos 'padrões sociais' já causa certa chuva de olhares, agora imaginem aí, ser headbanger no interior desse nosso país, mas quando eu falo interior, é interior mesmo, cidades com 30, 50, 100 ou no máximo 200 mil habitantes, distantes dos grandes centros urbanos, cidades onde até o surgimento das redes sociais o 'point' da galera era uma praça, geralmente em frente à igreja da cidade (ou a igreja matriz).

Nesse cenário onde 'shows mainstream' são sonhos distantes e talvez impossíveis, tem sim muitos bangers, muitas pessoas amantes da música pesada e profana, é de se concluir que em um território de dimensões continentais como o nosso, quantos grupos de headbangers existem, quase solitários, em meio as pequenas cidades interioranas, sejam no sul, sudeste, nordeste, norte ou centro-oeste, e as situações mais comuns vividas por esses indivíduos, quanto ao seu estilo e gosto musical, são:

- Esse cabelo aí é promessa? Eí você tem pacto com o demônio? Você entende o que, nessas músicas de doido? Cara você está no Brasil, tem que ouvir músicas em português, Como se dança rock? Rock é coisa do capeta, Você precisa é de uma namorada, Só anda com essas camisetas do demônio, Lá vem os caras que só usam preto, você vai beber vinho no cemitério? Um monte de vagabundos, drogados, desordeiros... Logo tudo que acontece de vandalismo nessas cidades é culpa de quem? – É claro da galerinha do rock...


(Vale ressaltar que existem sim uns babacas, sejam jovens revoltadinhos com a sociedade, mesmo sem saber definir ao certo o que é sociedade,  ou até mesmo uns caras de meia idade que tem uns comportamentos lamentáveis e vergonhosos, mas são exceções), e as senhorinhas na maioria das vezes crentes, que atravessam a rua, para não passar do teu lado, enquanto você vai andando todo felizão curtindo um som no fone, com aquela peita do Sarcófago – "Rotting" (rsrsrs). Porém turma, a maioria dos bangers são gente boa, pessoas comuns, trabalhadores, pais e mães de família, profissionais bem requisitados, e que estão aí no cotidiano servindo a sociedade em todo o seu bem-estar e funcionamento em ordem.

Mas mesmo com todas essas dificuldades nós ainda estamos aqui, somos a resistência, seja em meio ao sertão, em meio à planície, no extremo sul em meio aos pampas, ou no litoral do nordeste curtindo uma praia, cá estamos nós, e cultivamos os sonhos de irmos ver um show dos grandes nomes do metal mundial nos grandes centros urbanos, pois nas cidades em que vivemos isso é praticamente impossível, e aí rodamos 300, 400, 600, 800 km de carro, moto, ônibus, e em outros casos voamos aí alguns km para ver aquele show tão esperado, aquela banda que embala suas bebedeiras com a turma, ver seus ídolos a poucos metros, comprar merchan autografado, filmar momentos dos shows, e as inúmeras fotos, algumas trêmulas da mistura de emoção, adrenalina e álcool (rsrsrsrs), e para realizar tais sonhos, em alguns casos lá se vão economias de um longo período em pouco mais de um dia (contando viagem e show).

 

Por outro lado, nos últimos 15 anos, algumas cidades do interior passaram a receber shows undergrounds, que consideramos um marco para o meio metálico nacional, onde já podemos ver nessas cidades com 50, 100 mil habitantes bandas lendárias do underground, mas que mesmo assim, ainda não suportam os shows mainstream, e em casos ainda ficam distantes de outras localidades, aí entra em ação as famosas caravanas (que já foi tema de um outro texto nosso aqui), gerando viagens inesquecíveis, com histórias memoráveis.

Outra grande dificuldade que acredito também que nesse mesmo marco temporal de 15 anos para cá tem mudado, é a questão de aquisição de materiais, merchandising relacionado ao rock/metal, o que antes era uma enorme dificuldade, e aquela velha história de que CD, na cidade era um original e 300 cópias (rsrsrs), pois era só um que tinha condições de comprar seja pela internet ou nas capitais, e os demais só copiavam. Camisetas? Nossa nem falo...

Vou resumir um pouco do motivo que me fez criar a minha loja: Em 2005 para ter uma camiseta do Sepultura – "Roots", eu paguei R$ 85,00 (na época um absurdo). Daí resolvi que um dia eu teria uma loja com preços acessíveis para que outros bangers não passassem a depender de altos preços para ter um material de qualidade.

 

Mas voltemos ao assunto. Hoje se tem mais facilidade em partes em adquirir materiais, pois a internet é cheia de lojas, existem também as lojas físicas, que foram se espalhando pelo país e algumas delas estão localizadas no interior. Mas, mesmo assim ainda digo que o headbanger do interior tem dificuldades para adquirir bons produtos, sofre para presenciar bons shows mainstream, sofre preconceito, e ainda em muitas localidades sofre com o calor, ou seja somos sim a resistência dessa porra.

Uma coisa que o banger do interior tem, é paixão por eventos, pois já que são poucos e muitas vezes em períodos anuais, a disposição, energia e paixão que o cara vai aos eventos é de outro mundo, o cara se entrega ao evento, pois sabe que outro daquele poderá demorar a acontecer, ou por saber de todas as dificuldades teve até chegar lá. E toda essa paixão, energia é presenciada e sentida pelas bandas que fazem suas 'tours', considerando as cidades do interior na agenda, pois elas sentem toda a destruição que é fazer um show para uma galera sedenta, faminta por shows.

 

Sejamos sempre a resistência, sempre esses “malucos de preto” em meio a uma sociedade de cabresto, regida por uma política de merda, e com medos calcados na religião que condena a sua liberdade, em troca de sua salvação, sejamos sim esses que mete o pé na porta e diz: - "Aqui não, não iremos nos render as falácias, e ao falso moralismo, não iremos nos submeter a “cultura” da grande mídia, ao qual busca mais entretenimento enquanto a verdadeira cultura e informação é deixada de lado, fazendo a massa de marionetes de fácil comando, não seremos os cegos que podem enxergar se abrir os olhos, e nem os mudos, que se calam quando não estão de acordo com o manejo da sociedade, como gado em um rebanho!"

Sejamos sempre a força do metal, sempre a força motriz do underground, onde estivermos, no interior, na capital, nos grandes centros urbanos, ou nas pequenas cidadelas, honremos o metal, e lembremos sempre que o metal é contestador, é formador de personalidade e opinião, o metal pode não mudar o mundo por inteiro, mas pode ter certeza que se você for a fundo à essência do metal, ele irá mudar você como ser humano.


E aí, se identificou com o texto? Se sim, você sabe como é difícil nossa vida (rsrsrsrs)... Se não, parabéns pela oportunidade de morar onde se pode ter tudo isso aí ao alcance,na distância de uma ou duas conduções, mas você realmente valoriza a cena e as oportunidades que tem aí? Termino com essa reflexão!

Viva o Rock n’ Roll, viva o Metal!!!

Viva o Metal Extremo, viva o Underground!!!